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terça-feira, junho 14, 2011

O sensacionalismo do novo humor brasileiro

André Alves* - O humorismo no Brasil está mais dinâmico do que décadas atrás. Se antes havia os populares Chico Anysio e os Trapalhões que, genialidades a parte, muito do conteúdo se calcava em estereótipos, o atual humor na TV Brasileira está eclética, ainda que não dê pra dizer que profunda.

O humor da Globo já venceu faz tempo e tanto é verdade que até a turma do Casseta e Planeta pediu pra sair deixando os hipnotizados pela Vênus Platinada com as piadas requentadas e sem graça do Didi, a bobagem infantil dos Irmãos Cara-de-Pau e a geladeira de atores sem talento que é o Zorra Total.

“Brasília foi criada no meio do nada.
No meio do nada, não, pior:
no meio de Goiás”
Os “artistas” do Pânico na TV vieram como uma proposta grotesca mas de tanto tirar sarro de “celebridades” acabaram se convencendo de que eles também são. E o grupo do CQC que teve um início mais inteligente se rendeu a verve fácil de agradar a classe média com piadas preconceituosas (vale ler o artigo de Marcelo Coelho sobre a piada anti-semita de Danillo Gentilli).

Gosto do CQC e do Pânico na TV, mas estes programas seriam bem melhores se não tivessem se rendido ao que queriam criticar com o humor e aí a armadilha passa a ser outra. Deixamos rir do risível para rir do que não concordamos ou do que deveríamos nos indignar. E pelo menos no caso do já citado Danilo Gentilli e do Rafinha Bastos é fácil perceber que as piadas que atacam as diferenças regionais do Brasil e as políticas que atacam o PT são as que o público (classe média conservadora) mais ri. Para um goiano talvez não tenha tanta graça quando Gentilli, no seu DVD Politicamente Incorreto diz: “Brasília foi criada no meio do nada. No meio do nada, não, pior: no meio de Goiás”. E os rondonienses não devem ter gostado muito da piada de Rafinha quando ele disse em seu DVD “A Arte do Insulto” que Rondônia é o estado onde ele mais viu gente feia no Brasil.

Como estes programas e shows são produzidos por e para uma elite a risada sai fácil ainda que boa parte da platéia talvez nem saiba que o Distrito Federal fique encravado em Goiás ou onde fica Rondônia. Não estou inventado. Uma pesquisa de 2007 mostrou que metade dos brasileiros não sabiam localizar o país no mapa-múndi. Não é difícil supor que não conheçam também os estados alvos de piadas de relativo mal gosto.

Para Rafinha, Rondônia é lugar de gente feia
O caso de Rafinha é quase tão sintomático quanto o do defenestrável Diogo Mainardi  que em pelo menos dois artigos afirmou que pagaria uma fortuna para não ter que vir para Cuiabá. O humorista foi a Rondônia... para eternizar em seu DVD a sua decepção.

A mesma decepção que uma minoria rica tem de achar que o bom está no sul e no sudeste (é claro que tem muita coisa boa lá, mas é mais do que ridículo acreditar piamente nisso). Parte é culpa mesmo da audiência. Se não como explicar que o quadro Proteste Já do CQC praticamente só acontece em cidades do interior paulista ou que a Playboy só encontra mulher bonita no sul e sudeste. Como são preconceituosos... oops, preguiçosos esses olheiros.

Se rir de quem é de outro estado funcionasse sempre a história que segue abaixo seria mais engraçada, não só por ser verdadeira: Um publicitário de São Paulo foi a um município do interior de Mato Grosso conhecer um projeto socioambiental e ao visitar um viveiro se encantou com uma árvore adulta. “Nossa, que árvore interessante, que planta é essa?”, perguntou entusiasmado a um engenheiro florestal que respondeu meio sem jeito: “Isso é um mamoeiro!” O mesmo publicitário de São Paulo, uns dois dias depois, ao estar sendo atacado por simples pernilongos mostrou que era um cara precavido e sacou da sua mochila um poderoso repelente e começou a borrifar o produto em cada mosquito que via. Não! A graça não está no fato de ele ser publicitário de São Paulo. Na verdade, acho que ele é um marketeiro do Rio de Janeiro... A graça maior está em ele não ler as instruções de uso da embalagem. Ok, se vc for publicitário ou marketeiro do Rio ou São Paulo pode até não achar graça. Se for jornalista, vai gostar. Se for um morador de qualquer outra região do país, aí sim as duas anedotas serão sarcásticas. Hahaha.

Mas, enfim, o que quero dizer é: dá pra fazer bom humorismo sem incorrer a tantas muletas como falar mal de torcedores de times de futebol ou de estados distantes do sul-sudeste. Um caminho é tirando sarro de tudo, inclusive disso. Outro caminho é a nova revelação do humor inteligente: o programa da Multishow e o site Sensacionalista, que com seu bordão “um jornal isento de verdade” ri de tudo sem apelação, inclusive do seu suporte, o jornalismo.

Até porque se está comum piadista ser notícia e com um jornalismo medíocre cheio de piadas prontas nada tão a calhar como unir o inútil ao agradável!

* André Alves é jornalista e crítico de cinema


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5 comentários:

GIBA disse...

Muito bom, muito oportuno. Concordo com o que você diz.
Falta talento, genialidade no humor brasileiro. Faltam Chicos Anísios. Há um praga de comediantes que usam caricaturas de homosexuais como base para um humor ridículo (e preconceituoso).

Digo mais: tenho medo do poder indutor do atual humorismo brasileiro. Banaliza-se o crime,a a corrupção, a prevaricação, Isso não deveria ser objeto de humor, pois é muito sério, prejudicial aos cofres públicos e à formação do povo brasileiro.
Rindo-se disso, o povo se acomoda e ri da impunidade, conformando-se com ela, deixando de exigir justiça. Tenho medo do atual humor brasileiro. Certos programas humorísticos me deixam triste, quase a chorar !

Unknown disse...

Excelente artigo, André!

André Alves disse...

Valeu Thiago. Abraço

Gladstonier disse...

Quando alguém fala ou escreve certas coisas é com o interesse de agradar a grande maioria. As piadas do Rafinha Bastos agradaram a grande maioria e portanto ele atingiu seu objetivo. Acho que no seu comentário foram expostas apenas suas opiniões e preceitos (por que não dizer preconceitos). Outras pessoas gostam disso (e eu sou uma delas), acho que você deveria expressar sua opinião, como o fez, mas deveria acima de tudo respeitar a opinião alheia.
Att, Gladstonier

André Alves disse...

Olá, Gladistonier
Grato pelo seu comentário.
Olha, eu concordo em parte com o que você diz.
As pessoas devem falar ou escrever para expressar suas opiniões e não para agradar a maioria, eu sigo essa linha.
No caso de artistas, como o caso de Rafinha - que gosto dele enquanto jornalista e humorista mas ele passa do ponto de vez em quando - o papel aí sim é agradar a maioria.

No entanto, agradar a maioria não precisa ser sendo preconceituoso em relação a minorias. Esse acho que é o ponto que abordei no meu artigo.

E também não acho que me calquei em preconceito. Fui sarcástico, sim, invertendo a lógica das piadas para mostrar como essas piadas atinjem as pessoas.

Baseei-me em minhas opiniões, minha experiência, minha formação de jornalista e especialista em antropologia.

Talvez a maioria não concorde comigo, mas isso não significa que não tenha o que dizer e que não tenha quem queira ouvir.

Não é mesmo?

 
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