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domingo, maio 12, 2013

As Palavras


Terminei há pouco de ler “As Palavras”, autobiografia de Jean-Paul Sartre, um dos maiores pensadores do século passado e principal expressão do existencialismo ateu. Nesta obra, de 1964, o filósofo francês, ensaísta e romancista, que também passou pelo teatro e tem participação (não creditada) no roteiro do filme “Freud – Além da Alma”, de 1962 – que assisti antes de ter acesso a sua obra -, narra sua infância e sua descoberta pelo gosto pela leitura e pela escrita.
Ele afirma que aprendeu a ler sozinho a partir de um livro que já sabia de cor. Seu gosto pela escrita foi crescendo na infância criando histórias pueris que nunca terminavam. E muito por conta da sua família, protestante e católica, que apoiavam, mas sem muita ênfase, no seu dom pela escrita, esta vocação se concretizou em sua vida, atém mesmo porque recusava essa ideia de “dom”, como aparece num trecho em irônico diálogo com Deus.


Mas é claro que “As Palavras”, vai muito além disso. Sartre mostra suas inquietudes desde a infância sobre a religião, a burguesia, aos enquadramentos da vida. E faz isso com extremo bom humor e ironia às vezes refinada, às vezes escrachada, do mesmo modo que fez em alguns de seus romances.
Para quem compartilha das idéias do filósofo, que viveu com Simone de Beauvoir, “As Palavras” é um livro necessário para entender – por ele mesmo – quais fatos de sua infância ele julgou importante para refletir no homem que ele se tornou. Para quem simplesmente gosta de literatura – seja como leitor, como ensaísta ou como escritor, o livro tem papel ainda mais importante.
No meu caso, ainda que seja um existencialista meio leigo e um jornalista blogueiro, a obra ecoou de forma intensa. Ainda que, como ele próprio disse, “a cultura não salva nada nem ninguém, ela não se justifica. Mas é um produto do homem”. E inspira. E o que fazemos com ela podem ter justificativas e propósitos.
Sartre aponta também em seu ofício o ateísmo. A desconstrução dos dogmas religiosos de sua família – desde criança – foi fundamental para sua formação intelectual e em tudo que faria. Assim está em sua obra máxima, “O Ser e o Nada” (que espero ter fôlego antes dos 40 anos), e percorre todas suas publicações e peças.
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Conheci Sartre na adolescência, percorrendo a biblioteca na casa dos meus pais. Alguns exemplares da coleção Os Pensadores, que lia na adolescência, durante a madrugada dos finais de semana. Comecei por Sócrates, passei por Platão e finalmente o autor estrangeiro que mais me influenciou. Para ficar registrado, dos brasileiros o que mais gosto é Machado de Assis.
Na compilação da série “Os Pensadores” tem a transcrição da palestra “O Existencialismo é um Humanismo”, a parte I da “Crítica da Razão Dialética”, onde ele aproxima (ou tenta) o existencialismo do marxismo, e “A Imaginação”. Aos 15 anos entendi pouca coisa, quase nada do último citado. Mas nem por isso deixei de me seduzir pelos textos que reli várias vezes.
Já na faculdade comecei por ler A Náusea. E se existe um certo, acho que o fiz, porque foi seu primeiro romance. Ao terminá-lo desconfiei, e ele confessou em “As Palavras” que Roquentim era “ele próprio”. Não a história, mas suas reflexões, inquietações.
Suas inquietações vieram para mim e na sequência li na ordem a trilogia “Os Caminhos da Liberdade”: “A Idade da Razão”, “Sursis” e, por fim “Com a Morte na Alma”. Depois fui visitar Simone de Beauvoir mas até hoje só li “O segundo sexo”e “Os Mandarins”. Imperdoável. Eu sei! Anos mais tarde comprei seu livro de contos “O muro” e neste mês li a obra mais que citada neste post.
Para o filósofo escrever era uma necessidade. Para mim, lê-lo também o é. E mesmo após mais de 30 anos de sua morte (15 de abril de 1980) continua enfurecendo direitistas limitados. Mas o que falta também é a esquerda recuperar suas reflexões.

* Publicado originalmente no meu blog pessoal: http://blogdoandrealves.wordpress.com

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